sexta-feira, 4 de outubro de 2013

A Estrela (Conto)


Chico levantou bem naquele dia. O sol brilhava no firmamento e uma leve brisa tocava-lhe o rosto. Era dia de trabalhar, Deus já estava trabalhando, por isso ele precisava se apressar, era um mero instrumento do Criador, por isso levantou-se e dirigiu-se ao trabalho.
Logo na esquina presenciou uma discussão entre um casal. Ela dizia que tudo estava terminado, que o odiava. Indeciso sobre prosseguir ou não, Chico aproximou-se do casal, com tranquilidade inspirou-lhes o amor, a cautela, a compaixão, minutos depois o casal já conversava mansamente demonstrando o imenso amor que nutriam um pelo outro.
Mais adiante, enquanto Chico se encaminhava para seu trabalho, passou por dois motoristas que se ofendiam mutuamente por causa de uma pequena colisão. Mais uma vez Chico, nosso amigo, resolveu parar. Sua voz suave e seu toque sereno acalmou os dois homens que acabaram se perdoando mutuamente pela distração. A discórdia acabou e ambos seguiram para seu trabalho em clima de união.
Chico sorriu e continuou.
Seus olhos alegres se depararam então com a velha senhora jogada ao chão. A vestimenta rota, as mãos calejadas e o rosto vincado pelo sofrimento. Ele sentiu a amargura daquela alma, as dúvidas em seu coração mas Chico não teve duvidas, aproximou-se da mulher e conseguiu despertar-lhe o sentimento de luta, de coragem, de fé. A velha abraçou-o e afastou-se disposta a enfrentar suas dores tendo a Fé como escudo.
Chico seguiu para o trabalho.
O sol ainda brilhava.
Mas logo deparou-se novamente com outro problema. Um homem acusava um garoto de ter-lhe roubado a carteira. Chico olhou ao redor, o homem estava errado. Ele deu a volta e viu a carteira no chão, apanhou-a e devolveu-a ao homem mostrando lhe que a carteira caíra e não que fora roubada. Essa era a verdade.
E Chico continuou a andar e em seu caminho encontrou uma mãe que chorava a perda do filho, foi então que lhe falou da vida eterna, do mundo espiritual e do reencontro entre as almas afins, renovando-lhe desta feita, as esperanças. Transformando a tristeza em alegria e as trevas em luz.
Foi quando Chico chegou ao seu trabalho. Um senhor de certa idade logo veio encontrá-lo e abriu o portão para que ele entrasse . Com o olhar orvalhado Chico sentiu o abraço do querido amigo.
— Está atrasado hoje, Chico. Mas venha, venha logo meu amigo, as crianças o estão aguardando.
Chico entrou reconhecendo cada um daqueles rostinhos. Alguns choravam e Chico se aproximava para consolá-los. Alguns se sentiam abandonados e incompreendidos, assim como Chico se sentia as vezes,mesmo assim ele os ouvia e os compreendia. Chico amava, sem necessitar ser amado.
Dava o melhor de si sem esperar receber algo em troca. Perdoava o que lhe faziam dia após dia, pois sabia que quando morresse o Criador lhe daria uma nova vida, a vida eterna.
Ao final do exaustivo dia de trabalho, Chico agradeceu o alimento oferecido pelo querido amigo e partiu.
Tinha que repousar também
      Esse cachorro vem aqui todo dia! –falou a faxineira.
      Pois é, é o trabalho dele.- Falou o senhor fechando o portão.
      E para onde ele vai quando sai daqui?
      Ninguém sabe. Há anos ele vem até o orfanato. Era pequeno quando veio pela primeira vez, estava doente e eu cuidei dele, depois ele passou a brincar com as crianças e nunca mais deixou de vir aqui. Muitas delas tinham problemas de fala, de choro e hoje falam e não choram mais quando ele chega. As vezes acho que ele traz a cura para todos os males delas.
      Mas é só um cachorro.
      É ! - sorriu o velho vendo o amigo sumir na rua- É só um cachorro.
Chico esgueirou-se para o vão da velha padaria e deitou-se, de onde estava conseguia ver bem as estrelas. Estava ansioso, aliás, como sempre ficava.
Lembrava-se pouco de sua vida, sabia apenas que fora abandonado ainda filhote nas ruas da cidade, o velho ancião o socorrera, abrigara e alimentara, mas também não tinha um espaço para que ele ficasse. Ninguém tinha. Chico lembrava-se também que pensara em se matar, estava cansado de ser incompreendido pelos humanos, humilhado e maltratado, até que um dia aquela estrela caiu do céu.
Lhe disse tantas coisas e o ensinou a viver, dizia que os homens precisam aprender a viver também e que cabia a ele: Chico, o cão das ruas, ensinar.
Disso ele jamais se esqueceria, da doce oração que a estrela fizera ao seu lado, da compaixão que vira em seus olhos e do amor que transbordava em suas palavras.
Chico remexeu-se e olhou o céu. Uma delas começou a brilhar mais e o cão abanou o rabo todo feliz quando a luz esmaeceu e transformou-se num homem que se aproximou dele com um sorriso meigo nos lábios.
Chico rastejou até ele e lambeu-lhe os pés, por sua vez, o homem curvou-se em sua direção e tocou-lhe a cabeça .Depois sentou-se ao seu lado e seus lábios proferiram a oração que Chico já conhecia. E a cada linha, o velho cão de rua lembrava-se do que acontecera durante o dia:
Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz : sim, Chico era o instrumento do qual o Criador se utilizava para instruir os homens.
Onde houver ódio que eu leve o amor: o casal que brigava na rua, ele se aproximara e roçara na calça da jovem, fora o bastante para fazê-la pensar e mudar de opinião.
Onde houver ofensas que eu leve o perdão: os motoristas que discutiam, Chico começara a latir para chamar-lhes a atenção, os dois o viram e ouviram, sorriram e se perdoaram.
Onde houver discórdia que eu leve a união: sim ele interrompera a discussão com seus latidos insistentes.
Onde houver dúvidas que eu leve a fé: a velha senhora que achava que tudo havia acabado, mas que, quando Chico se aproximara dela, ela como que despertara de seu torpor, achando que o cão era um sinal, renovando-lhe a fé que ainda havia em seu coração.
Onde houver erro que eu leve a verdade: a carteira que ele encontrara caída no chão.
Onde houver desespero que eu leve a esperança: a pobre mãe que perdera momentaneamente a esperança de rever o filho amado.
Onde houver tristeza que eu leve a alegria: inspirado pela estrela guia que o acompanhava, a mãe compreendeu que a vida não terminava ali.
Onde houver trevas que eu leve a luz : das trevas de sua tristeza, surgiu a luz de uma nova alegria.
Oh Mestre, fazei que eu procure mais
Consolar que ser consolado: quantas noites ele não passara sozinho.
Compreender que ser compreendido: quantas humilhações não passara.
Amar, que ser amado:  ele amava aquelas crianças.
Pois é dando que se recebe: dava à elas o pouco que tinha.
É perdoando que se é perdoado: perdoava que o velho ancião não lhe desse abrigo.
E é morrendo que se vive; mas sabia que um dia morreria.
Para a vida eterna
Chico sorriu e recebeu um abraço do homem que se transformou novamente em luz . Luz que virou estrela e passou a brilhar na imensidão do céu. Depois aninhou-se em seu leito de madeira e adormeceu, aquela candura do homem ainda embalava seus sonhos e a tranquilidade dele, invadia-lhe o coração, Chico não sabia quem era ele, só sabia que aquela estrela tinha o mesmo nome dele:
Francisco, Francisco de Assis!







Simone Nardi – criadora deste blog e do antigo Consciência Humana, colunista do site Espírita da Feal (Fundação Espírita André Luiz) ; é fundadora do Grupo de Discussão  Espírita Clara Luz que discute a alma dos animais e o respeito a eles.Graduada em Filosofia e Pós-graduada em Filosofia Contemporânea e História pela UMESP.






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